sábado, 16 de outubro de 2010

Refletindo sobre Gangues e Galeras!

Galeras Cariocas


             Esta parte do trabalho integra o trabalho final do Curso que realizei em Brasília na UNB no curso Direitos Humanos e Cidadania e irá tratar sobre as galeras. Um movimento transgressor bastante comum em grandes cidades, em especial no Rio de Janeiro. Inicialmente situaremos o jovem contemporâneo na sociedade e suas implicações na moldura de comportamentos que desafia a ordem estabelecida pelo tecido social. Em seguida, analisaremos as gangues nos Estados Unidos e as galeras na França. No final trataremos das galeras brasileiras demonstrando toda a sua peculiaridade, do seu caráter festivo e da diferença que há entre as galeras e as quadrilhas.  Deste modo, teremos uma idéia mais substantiva a respeito do movimento das galeras cariocas que muitas da vezes é encarado como algo marginal.

           A tarefa de definir o jovem contemporâneo não é fácil.  O que se observa na atualidade é uma mercantilização da imagem do jovem por meio da sua rotulação , ou seja, o fato deles terem se tornarem uma espécie de mercadoria que seduz os consumidores de todas as idades, tudo isso  gerado por uma cultura de massa. O “jovem” é usado como símbolo de rebeldia e principalmente de mudança. Tudo isso desemboca numa diversidade cultural criada pelos adolescentes contemporâneos que envolve todo um comportamento de rebeldia, agitação, mal-estar, tensão, crise psicológica e conflito. Com efeito, a mudança é a tônica da vida do jovem,  ou seja, a busca por aquilo que não é uniforme e estático.
 Analisando as gangues dentro da sociedade norte-americana, nos anos 60 verificou-se que elas estavam intimamente ligadas a alguns fatores como às frustrações deles em não terem oportunidades de ascensão social, toda uma geração de imigrantes excluída na sociedade e por uma rotulação que se fazia dos jovens pobres ou eticamente inferiorizados. Na verdade, o que se observava era que na cidade havia grupos de interesses, de pressão de diverso tipos vivendo num ambiente de conflito entre eles. A divisão do espaço urbano refletia os valores culturais marcados pelo individualismo que agravava a competição no mercado e a obtenção de sucesso. Desta forma, o que é peculiar nas gangues norte-americanas são as relações que mantêm com a vizinhança do bairro onde moram, suas atividades legais e ilegais, os estilos de consumo, os símbolos, seus rituais, a organização hierárquica entre eles e o conflito entre gangues. Mais uma vez, esse tipo de transgressão reflete valores da cultura norte-americana. 
Já na Europa a nova onda de criminalidade é justificada pela exclusão social. Além disso, a questão da exacerbação dos sentimentos nacionais e identidade étnica geram bastante violência. Fruto da exclusão social os movimentos das galères na França, menos violentos que nos EUA, são muito mais atos de incivilidades, não há um inimigo claro. Diferenciando as gangues francesas das norte-americanas via-se que na França os grupos não estavam tão vinculados ao crime organizado. 
Outro aspecto é o cultural, na Europa os índices de criminalidade baixaram muito devido a idéia de comunitarismo, solidariedade e coletividade que tinham grandes pesos nos arranjos sociais, enquanto que nos EUA o que prevalecia era a individualização e a competição de mercado. 
No Brasil do início do século XX, a cidade do Rio de Janeiro era  representada concomitantemente pela rivalidade e o encontro dos diferentes segmentos sociais, que realizavam competições pacíficas como os concursos e desfiles carnavalescos. Contudo, com o processo de globalização a indústria cultural alterou essa situação, principalmente criando novos comportamentos baseados em valores de consumo. Sendo assim, a situação do jovem mudou, diferente dos EUA onde a família tem um grande valor moral, no Brasil os laços familiares foram divididos devido a ruptura da base familiar que provinha toda a educação do jovem. Além disso, de um modo geral outro fator de desestruturalização social  é o fato do processo civilizador ter sido interrompido e vem sofrendo uma involução, surgindo assim uma violência dentro das próprias classes, ou seja, o que eles chamam de “molecular” dentro dos mesmos segmentos, classes sociais, grupos étnicos e até na mesma vizinhanças. 
As pessoas em geral costumam confundir “quadrilhas” de bandidos com galeras, porém, na verdade, são grupos bastante distintos. Nas quadrilhas há uma preocupação em se enriquecer rápido, seja matando ou roubando. Mesmo dentro das quadrilhas existem diferentes tipos de bandidos, desde ladrões pobres que roubam apenas para sua sobrevivência e que nem usam armas, até bandidos que roubam e matam pelo simples prazer. Um dos pontos críticos das “quadrilhas” são os efeitos desastrosos da guerra entre as próprias “quadrilhas, nas quais, segundo Alba Zaluar, são responsáveis por quase a totalidade dos mortos, devido à luta entre bandidos que acabam se matando pelos mais diversos motivos. O uso de armas, por sua vez, é um símbolo de poder , ostentação e virilidade. A honra na periferia é defendida ao extremo, o “barato” é ser esperto e não deixar ser passado para trás. “Mais humilhante do que ser pobre é ser um “bobo”.
 
Já que o Estado não propicia a educação que é importante na formação do caráter do indivíduo, além do próprio Estado violar a dignidade desse povo humilde ao não fornecer o mínimo necessário para uma vida digna, as pessoas procuram em seu próprio meio, ter pelo menos prazer de ser melhor que os marginalizados que vivem ao seu redor.
 Em contrapartida,as galera brasileiras, assim como na França, possuem a característica de não possuir um líder instituído ou qualquer ritual de admissão, ao praticarem atividades ilícitas estas são de forma passageira, sem ser um meio de vida. Ao diferenciar as “quadrilhas” das “galeras” verifica-se que as “quadrilhas” são, na verdade, uma escola do crime, enquanto que as galeras têm mais um espírito lúdico, sua principal atividade não é a luta e sim o baile, estas têm características peculiares do carioca que é o caráter festivo. 
Desmitificando a imagem das galeras no Rio de Janeiro e fazendo um raio x da situação do jovem atual, verificamos que a transgressão assume diversas formas, seja nos Estados Unidos com as gangues ou na França com as galères, o jovem procura buscar uma identidade própria. Uns vêem na transgressão criminal uma forma de ascensão social e a busca pelo sonho que a indústria de cultural transmite por meio de valores consumista. Outros procuram transgredir por meio da música, da dança, dos bailes funk, em resumo, através da diversão sem que isso prejudique outras pessoas. Assim são as galeras cariocas, transgressores da diversão, diferentes das “quadrilhas” transgressores da vida. 

Bibliografia: Vianna, Hermano – Galeras Cariocas, territórios de conflitos e encontros culturais .Editora UFRJ 1997

Um comentário:

  1. Muito interessante a comparação sobre os agrupamentos de jovens, nos EUA, na França e no
    Brasil. Como pano de fundo quase sempre temos a pobreza e a falta de oportunidades aos mais desprovidos, como bem coloca a Socióloga Marcia.
    Enquanto os jovens de boa índole se agrupam para fazer festas, os de má índole(talvez os mais atingidos pela falta de oportunidades)se agrupam para roubar, assaltar e assassinar.
    Marcia é uma pessoa inteligente,atenta ao que se passa no mundo de hoje, principalmente com os que não tiveram oportunidades de ascensão social, e colocou com muita sabedoria sua interpretação dos acontecimentos de hoje.
    Parabéns pelo teu trabalho.

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